Os economistas do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) divulgaram
uma avaliação, com dados obtidos pelo
cruzamento de pesquisas divulgadas pelo SPC ao longo de 2013, todas
encomendadas com o intuito de entender a relação do consumidor adulto
brasileiro com o próprio dinheiro. A principal conclusão dos
especialistas é que a situação de inadimplência no Brasil — ao contrário do que muitos pensam — está relacionada a maus hábitos de planejamento
financeiro, e nem sempre à renda baixa. Como apontam as pesquisas,
existe descontrole financeiro e inadimplência mesmo entre as famílias de renda elevada. Dados de quatro estudos indicam que pessoas com contas em atraso não têm
necessariamente renda menor do que aquelas que pagam os compromissos em
dia. Uma pesquisa encomendada em agosto de 2013 para traçar o perfil do
consumidor inadimplente no país revelou que 16% da amostra de pessoas
com contas em atraso há mais de 90 dias pertenciam às classes D e E
(renda familiar inferior a R$ 905 por mês). No entanto, ao avaliar essa
mesma concentração de consumidores de menor renda (classes D e E) entre a amostra de adimplentes, o percentual subiu para 22%. “De maneira geral, os estudos sugerem que consumidores adimplentes adotam
práticas financeiras mais cautelosas e conservadoras, independentemente
da classe social a qual pertencem. Isso inclui hábitos como o de
planejar os gastos, poupar dinheiro para uma emergência e o de não
emprestar o próprio nome a terceiros”, explica a economista do SPC
Brasil, Luiza Rodrigues.Faça o que digo, mas não faça o que faço Dois estudos sobre a Educação Financeira do Brasileiro (fevereiro/2013) e
sobre o Comportamento de Consumo no Brasil (outubro/2013) mostram que a
maioria dos brasileiros (88%) se declara “muito controlado” ou
“moderado” em relação aos hábitos de compra. No entanto, apesar da
autoimagem de controlado em relação às compras, os consumidores
relataram ao SPC Brasil diversas práticas que contradizem esse
comportamento ideal: 59% já ficaram no vermelho por conta de gastos que
não precisavam ter realizado e 69% dos consumidores já fizeram compras
apenas para “se sentirem fortes, ricos ou poderosos”. Além disso, em relação às finanças pessoais, o consumidor mostra-se, no
geral, pouco preparado para qualquer emergência financeira: 42% dos
adultos entrevistados declararam que não guardam qualquer quantidade de
dinheiro para uma situação de emergência. “Em muitos casos, os estudos
sugerem que adoção de hábitos simples de planejamento financeiro poderia ter evitado a situação inadimplência. E comportamentos impulsivos de
compra e hábitos de risco foram detectados em todos os extratos
sociais”, afirma Luiza. Diferenças de comportamento Os adimplentes não somente possuem posturas menos arriscadas como também têm hábitos ligados a um bom planejamento financeiro. As pesquisas do SPC Brasil relevam que, com relação aos adimplentes, 76% fazem lista de
compras antes de ir ao supermercado, 83% pesquisam preços antes de
comprar qualquer produto ou serviço, 63% acompanham mensalmente das suas receitas e despesas (seja em uma caderneta ou planilha) e 17% buscam
informações sobre questões financeiras com frequência. Em contrapartida, quando consideramos o grupo dos inadimplentes, tais percentuais caem
respectivamente para 61%, 66%, 38% e 3%. Ainda com relação às diferenças de postura frente ao endividamento, outro
ponto a ser destacado é que, ao contrário dos inadimplentes, os
adimplentes vêem as dívidas como evitáveis. Dentre os adimplentes, 93%
evitam dívidas, seja controlando os impulsos de compra (37%), seja
fazendo planejamento financeiro (56%). Além disso, 35% desse grupo fazem fundo emergencial (dinheiro guardado para emergências). Já com relação
aos inadimplentes, 54% afirmam que a dívida que têm atualmente não
poderia ter sido evitada — já que ocorreu por motivo alheio a sua
vontade (como desemprego) — e apenas 38% afirmam que a falta de controle financeiro foi o principal motivo para o endividamento. Inadimplentes tendem a se arriscar mais Os inadimplentes também adotam posturas mais arriscadas em relação a
empréstimo de nome: 20% dos entrevistados desse grupo revelaram que têm o hábito de emprestar o próprio nome a terceiros para que estes possam
fazer compras. Destes, 96% não tomam nenhuma precaução (como pedir uma
nota promissória a quem emprestou o nome). No grupo dos adimplentes,
apenas 9% têm esse hábito, dos quais 69% não tomam nenhuma precaução (os demais 31% são precavidos e exigem algum tipo de garantia). Ressalta-se que os inadimplentes também tendem a buscar mais crédito em lojas e menos em bancos: 53% dos consumidores negativados possuem cartão de loja, enquanto que o percentual cai para 46% quando comparados com os
não negativados. Além disso, segundo os estudos, 53% dos consumidores
inadimplentes possuem cartão de crédito de banco, enquanto que 61% dos
adimplentes dispõem desse mesmo recurso. Para os economistas, as pesquisas feitas pelo SPC Brasil mostram que o
brasileiro ainda necessita de educação financeira mais aprofundada. “Os
resultados apontam para uma alta frequência de consumidores impulsivos,
levados pela moda, propaganda ou desejo de auto-afirmação. Além disso, a inadimplência parece estar ligada, em muitos casos, à falta de hábitos
simples de planejamento financeiro e de precaução contra emergências”,
explica Luiza.