Poder e Cotidiano em Sergipe
“Em Sergipe existem mil obras com recursos federais abandonadas”, diz Luciano Barreto 5 de Junho 19H:45

“Em Sergipe existem mil obras com recursos federais abandonadas”, diz Luciano Barreto

Aos 76 anos, trabalhando diariamente das 8 da manhã às 8 da noite, Luciano Barreto, presidente da Construtora Celi, não é apenas um dos empresários mais bem-sucedidos do estado – ele é uma liderança no setor, presidindo a Associação dos Empresários em Obras Públicas e Privadas (Aseopp).

 

Em conversa com o BLOG DO MAX/JORNAL DA CIDADE, o empreendedor falou sobre o momento econômico e se mostrou otimista. Destacou as reformas, que considerou imprescindíveis, e outras medidas econômicas, que avaliou como sólidas - e que por isso estariam atravessando a crise política.

 


Sobre obras públicas, ele afirmou que mais de mil delas, com recursos federais, estão paralisadas em Sergipe. Por fim, Luciano Barreto garantiu que a Caixa Econômica Federal em Sergipe possui hoje mais de R$ 1 bilhão em estoque, recursos que poderiam estar sendo aplicados em obras no estado. O dinheiro estaria travado por excesso de burocracia. Confira a entrevista abaixo.

 

 

BLOG DO MAX - Como o senhor analisa o cenário econômico do país, com uma conjuntura política tão conturbada?
Luciano Barreto – O que eu posso dizer é que estou otimista. Nós estávamos com inflação na casa de 10,5% e já estamos abaixo de 4%, abaixo da meta. A gente vê o Comitê de Política Monetária reduzindo a taxa Selic para 10,25%. E o PIB, pela primeira vez nos últimos tempos, apresentou um crescimento de 1% no último trimestre. São indicadores a partir dos quais vai se permitir o crescimento mais sustentável. Você não cresce com juros altos, com inflação alta, porque todo mundo deixa de investir para buscar proteção. Esses dados são consequência da política econômica, que visa acima de tudo que não se gaste mais do que se arrecada – é o ajuste fiscal. Poderíamos estar mais otimistas. Mas as turbulências políticas influenciam na economia.

 

BM - Então o senhor acredita que esses problemas no campo político devem mesmo contaminar a economia?
LB – Desta vez, como parece que as medidas econômicas são sólidas, a turbulência política (que foi muito grande) não tem tido a influência que a gente sentiu em períodos anteriores. O Brasil tem crises desde que comecei a Celi. De dois em dois anos, de quatro em quatro anos. Mas pela primeira vez, coincidiu a crise política no meio de um processo de recuperação da economia. E a economia está sofrendo, mas não tanto.

 

BM - O atual cenário não está atrapalhando a recuperação econômica?
LB – Não está impedindo. É lógico que atrapalha, porque um país precisa ter a confiança dos investidores. Mas de alguma forma, o país está continuando uma política de recuperação, as reformas são importantes.

 

BM - O senhor então está otimista em relação às perspectivas da economia nacional?
LB - Vejo o cenário com muita esperança, um cenário positivo. E espero que o país volte a crescer e a gerar empregos. Mas defendo que alguns setores deveriam estar sendo mais estimulados. Por exemplo: construção civil, agricultura, turismo. O que me preocupa é que houve um grande desemprego na construção civil. E neste setor são desempregados trabalhadores que não possuem qualificação para almejar empregos melhores. Tenho defendido grandes programas habitacionais, valorizando a pequena e média empresa, para que seja possível a geração de empregos, contribuindo para o crescimento. Em todos os países do mundo que passaram por crises, o primeiro foco foi a construção civil. Durante a crise do subprime, os Estados Unidos estouraram o orçamento, aumentaram o endividamento, injetaram dólar na economia e investiram muito em obras públicas.

 

BM – Historicamente o investimento na construção civil, em obras públicas, é utilizado como saída para as crises. Isso foi visto na Europa, nos Estados Unidos, em diferentes períodos...
LB – Qualquer país do mundo começa pela construção civil. No Brasil temos o privilégio de contar com uma agricultura forte, a possibilidade de contar com um grande potencial do Turismo, com belezas que chamam a atenção de todo o mundo. Não estamos entre os maiores pólos de turismo do mundo, enquanto destino, porque nos falta oferecer segurança.

 

BM - A classe empresarial tem defendido as reformas. Mas a oposição ao governo avalia que a longo prazo elas podem gerar o empobrecimento da população, com salários menores... O senhor concorda?
LB – Na minha opinião as reformas são indispensáveis para que o Brasil possa crescer e gerar empregos. Você pode discutir um item ou outro da reforma, mas do ponto de vista global há uma necessidade de reformar. Eu tenho 76 anos e estou aqui trabalhando. Saio de casa 7:30 e chego 8 horas da noite. E Deus me livre não ter onde trabalhar. A população brasileira tem envelhecido, graças a Deus. Você vê que esse argumento não é tão importante porque você viu o Congresso Nacional aprovar a idade limite para aposentadoria [compulsória] do setor público aos 75 anos de idade. Então porque não 65 anos? Não é possível o país conviver em uma economia onde eu me aposente aos 50 anos. Você deve conhecer pessoas nessa idade aposentadas. Além disso, qual é o país do mundo que consegue pagar aposentadoria integral? Então acho que a reforma trabalhista precisa ser aprofundada. O presidente criou uma comissão para se discutir toda a legislação trabalhista e é preciso modernizar. Respeito a opinião da oposição. Talvez se a oposição estivesse na situação estaria defendendo as mesmas coisas, já que algumas dessas reformas chegaram a ser proposta pelo ministro da fazenda do governo Dilma, e ela não teve apoio do Congresso para realizar, por questões políticas.

 

BM - O senhor falou em incentivar a construção civil. Qual o cenário deste setor em Sergipe? Houve muitas demissões?
LB – Não temos números exatos, mas creio que no mínimo 60% da força de trabalho foi demitida. Houve uma diminuição muito grande do mercado de obras imobiliárias. Empresas que tinham dez a quinze empreendimentos estão com um ou dois. São obras que geram muitos empregos. A sorte ainda é que o governo do estado tinha alguns financiamentos aprovados, negociou mais alguns financiamentos, o que gerou um volume muito grande de obras públicas, que tem absorvido uma parte desse pessoal.

 

BM - As construtoras estão todas nessa situação?
LB – Sergipe hoje possui a indústria de construção mais sólida do Nordeste. Você tem aqui empresas que vêm trabalhando muito o programa Minha Casa, Minha Vida. São empresas sólidas, você não vê em Sergipe empresa local deixar de entregar uma obra nem cumprir um prazo, ou atrasar muito. Sergipe está preparado para uma retomada da construção, e é preciso investimento público.

 

BM - Mas há esse cenário de construtoras sem o lançamento de novos empreendimentos...
LB – O que os empresários estão fazendo, eu imagino, é se preparando para o momento após essa diminuição de estoque. A gente já sente o mercado se reanimando. O feirão da Caixa [Econômica Federal] mostrou isso. O que as empresas estão fazendo é preparar projetos, negociando financiamentos. Se mantido o atual status da economia, um processo de recuperação, com diminuição de taxas de juros e estabilização da inflação, você vai ter muitas empresas lançando produtos que estão sendo planejados agora.

 

BM - Em quanto tempo o senhor acha que veremos essa recuperação efetiva, com construtoras contratando trabalhadores e apresentando novos lançamentos?
LB – Acho que já no último trimestre deste ano. Desde que mantida essa recuperação que está aí, haverá uma reativação. O governo lançou agora o programa Minha Casa, Minha Vida, na faixa 1, que gera muito emprego. E eu soube que Sergipe terá uma cota neste programa. O governador Jackson Barreto tem batalhado para separar uma parte deste programa para ser aplicado em Sergipe.

 

BM - Há previsão de quantas unidades serão financiadas com esses recursos?
LB - Acho que no momento, vai caber para Sergipe 3 a 4 mil unidades.

 

BM - O senhor vem levantando há algum tempo a bandeira das obras públicas. Os problemas neste setor continuam, com várias paradas ou abandonadas?
LB – O problema hoje no Brasil são as obras públicas com recursos oriundos do Governo Federal. Porque o modelo de controle que é feito pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela Controladoria-Geral da União precisa ser repensado. E nós temos apresentado várias propostas para isso. No Brasil de hoje ninguém está preocupado com qualidade nem com prazo. O que interessa é o menor preço. Então você vê obras que se iniciam com propostas visivelmente inexequíveis e que o poder público é obrigado a contratar, porque está dentro das normas e regulamentos do TCU. Hoje o orçamento de obras públicas é todo tabelado pelo TCU, quando o dinheiro é federal. A empresa só faz botar preço da tabela do TCU. Costumo dizer que o máximo vira o mínimo. E como pode então a empresa dar 30% de desconto? Não vai fazer direito, e é o que se vê.

 

BM - Quantas obras abandonadas há hoje em Sergipe?
LB - Segundo dados de uma técnica do Ministério do Planejamento, em palestra feita há poucos meses em Aracaju, em Sergipe existem mil obras com recursos federais abandonadas. E não aparece ninguém do TCU e CGU para apurar por que estão paradas, se vai concluir ou não. Eu acredito que este número seja maior.

 

BM - As obras estão abandonadas por falta de recursos?
LB – Se fala muito em falta de recursos, mas existe hoje na Caixa Econômica aqui em Sergipe um estoque de mais de R$ 1 bilhão em recursos, somente para o estado e para o município. Recursos que não são aplicados e poderiam gerar milhares de empregos. Por culpa única e exclusivamente da burocracia.

 

BM - Que recursos são esses?
LB – Alguns de financiamento do fundo do FGTS e alguns do Orçamento Geral da União – emendas de deputados e etc.

 

BM– São recursos já depositados na Caixa, que já estão disponíveis?
LB – Isso, já estão disponíveis.

 

BM - Como fazer para destravar esses recursos, para que governo e prefeitura tenham acesso a isso?
LB – Tanto o governador Jackson Barreto como o prefeito têm trabalhado demais para liberar essas verbas. A Caixa Econômica, que faz a gestão dos recursos, não tem culpa. Mas são tantas normas, tantos procedimentos, de tantos órgãos, que é uma verdadeira via crucis. E aí as obras não começam, ou quando começam, param. Hoje, em qualquer coisa tem que ouvir a Procuradoria-Geral do Estado, o TCU manda para o Ministério Público e você tem que responder porque aquilo. Estamos vivendo um processo no Brasil que torna impossível fazer uma obra pública com recursos federais.

 

BM - O senhor vê perspectivas de melhoras deste cenário?
LB – Há dez anos nós estamos apresentando propostas e apontando as inconveniências do sistema que está aí. Está demonstrado que não há controle nenhum sobre as grandes obras, enquanto as pequenas e médias estão com um controle excessivo, que não permitia que elas fossem executadas. E o que é que isso conduziu: Sergipe talvez seja uma exceção, mas no Nordeste, 70% das empresas que lidam com obras públicas com dinheiro federal ou desistiram ou estão em situação muito difícil. Porque hoje no Brasil todo mundo é culpado, você tem que provar que não é culpado. É uma pena, porque todo esse modelo de controle, que precisa ser rediscutido e repensado, conduz a obras que não andam e que possuem má qualidade.

 

BM - Não há sequer uma luz no fim do túnel, um projeto em andamento, para mudar isso?
LB – Há um projeto de reformulação da lei 8.666 [Lei das Licitações]. A convite do Congresso estive há dois anos lá, apresentando nossas sugestões e propostas. Mas parece que até agora não andou nada.

 

Foto: Celi

Comentários

  • Seja o(a) primeiro(a) a comentar!

Deixe seu comentário

Imagem de Segurança
* CAMPOS OBRIGATÓRIOS
Whatsapp

Receba notícias no seu Whatsapp.

Cadastre seu número agora mesmo!

Houve um erro ao enviar. Tente novamente mais tarde.
Seu número foi cadastrado com sucesso! Em breve você receberá nossas notícias.