Poder e Cotidiano em Sergipe
Culinária como referência cultural 18 de Julho 5H:10

Culinária como referência cultural

Por

Os saberes e fazeres dos mais diversos pratos da culinária brasileira estão ligados aos aspectos socioculturais de nossa história, sobretudo, aos encontros entre várias culturas ao longo do tempo. Sendo assim, recebemos a influência de outros povos que aqui estiveram, nos deixando legados que hoje fazem parte do nosso patrimônio cultural.



Os índios e os africanos são grupos étnicos que contribuíram incomensuravelmente para a formação das identidades culturais do país. Não há como falar de história, memória e patrimônio cultural, sem mencionar a figura desses povos. Em nossa gastronomia, podemos perceber claramente no preparar dos alimentos, as maneiras de servir e de comer. Não obstante, a contribuição deixada pelos europeus, principalmente, os portugueses, como de outros grupos étnicos e sociais A união desses grupos criou uma cozinha tipicamente brasileira.


A diversidade presente no meio ambiente propicia uma gama de receitas em nossa culinária, como por exemplo, a farinha de mandioca, tão popular entre o povo, de qualquer classe social, sendo uma herança indígena que através de sua matéria prima, diversos alimentos são criados e recriados.


O reconhecimento e a valorização do alimento pelo seu caráter simbólico, nos traduz a comida enquanto um elemento de referência cultural. Assim, a gastronomia é parte desses processos culturais para entender a nossa identidade. Como também, a noção que podemos denominar como bem cultural imaterial uma ou mais culinárias, a depender de sua identificação.


Cada cultura gera uma gastronomia tradicional, com suas peculiaridades presentes em todas as receitas. Os saberes e fazeres em torno da comida é objeto de registro enquanto patrimônio imaterial, e não a comida em si. A mistura dos alimentos e o encontro de diversas tradições culturais fazem a inter-relações entre os aspectos culturais e simbólicos a partir do preparo dos alimentos. (AGUIAR, Janaina Couvo. Identidade, Patrimônio Cultural e Comida).


Através do decreto nº27.720, de 24 de março de 2011, Sergipe reconhece algumas comidas, a saber: a  queijada, o manauê, o beiju de tapioca, a bolachinha de goma, o doce de pimenta do reino, o pé-de-moleque de massa de puba, o amendoim verde cozido, o macasado e o saroio. Concernente ao Amendoim Verde Cozido, temos outro instrumento de salvaguarda que é a Lei nº7.682, de 17 de julho de 2013, que torna Patrimônio Imaterial de Sergipe e dá outras providências correlatas.


(...) Conforme estudos realizados pela pesquisadora Ana Maria Medina, a Cultura alimentar é fator de identificação das comunidades. Os alimentos encerram em si mesmos as histórias dos ritos e de suas culturas, sendo, portanto, pertinente sua classificação como bem imaterial.  No Brasil, a mistura de etnias criou uma culinária plural com marcas indígenas, africanas e européias. O colonizador não fugiu ao processo de aculturação, encontrou as nossas farinhas nativas e com elas adaptou às suas receitas.(...)


Como descreve a pesquisadora, Sergipe recebeu de forma efetiva em sua culinária a influência da cozinha indígena, da cozinha proveniente dos engenhos-casa grande e senzala e da culinária conventual, freirática, com doces, sequilhos e licores, etc.


Ao falar de comidas típicas do Brasil, lembramos logo de uma raiz bem genuína,  a mandioca. Através dela várias receitas são produzidas e estão ligadas a certos espaços geográficos. A mandioca está presente de norte ao sul do país, possui grande importância histórica e cultural, sendo fundamental por um longo período, na alimentação dos nativos como também dos europeus. Vários pratos são preparados provenientes dessa matéria prima, como o beiju, considerado o pão dos índios brasileiros. Diversos tipos e sabores de beiju eram preparados pelos nativos.


Uma variedade de alimentos tradicionais são vendidos em feiras livres e algumas dessas culinárias possui um caráter de identificação local. Quando falamos de queijada em Sergipe, por exemplo, nos reportamos logo a São Cristóvão. Isso não quer dizer que a queijada é comercializada somente nesse município. No entanto, os modos de fazer queijada e bolachinha de goma de São Cristóvão, são as que foram consideradas patrimônio cultural sergipano, dentro das comidas selecionadas no Decreto 27.720. Por exemplo, no município citado temos três grandes famílias que produz a Queijada, na Avenida Lourival Batista, conhecida como Colônia Pintos, com a família de Dona Maria, na Ilha Grande com Dona Madalena, e no Povoado Pedreiras com a família de Dona Maria de Neném da Padaria Colonial. No Centro Histórico de São Cristóvão, temos a Casa da Queijada de Dona Marieta, que além de fabricar também comercializa. 

     
A comida tem o poder de nos transportar rapidamente ao passado. Provoca a nossa memória, nos traz lembranças principalmente através dos sabores e dos cheiros. Quem nunca comeu algo e lembrou mamãe, vovozinha, titia fulana de tal? Mas, quem nunca comeu algo e lembrou uma localidade, um povo? Porém, quando a lembrança é coletiva, nos faz identificar a tamanha referência cultural de um bem, e por ai, passamos a denominá-lo como patrimônio cultural após o reconhecimento.

Aracaju, 17 de julho de 2014.

Marcos Paulo Carvalho Lima
Pesquisador



Referências Bibliográficas:

CASCUDO, Luiz Câmara. História da Alimentação no Brasil. 1968

FREIRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala. 1933

Fontes Consultadas:
Decreto nº27.720
Lei nº 7.682

Processo nº027.000.000.32/2009/SEC

Comentários

  • Seja o(a) primeiro(a) a comentar!

Deixe seu comentário

Imagem de Segurança
* CAMPOS OBRIGATÓRIOS
Whatsapp

Receba notícias no seu Whatsapp.

Cadastre seu número agora mesmo!

Houve um erro ao enviar. Tente novamente mais tarde.
Seu número foi cadastrado com sucesso! Em breve você receberá nossas notícias.